Domingo IV do Tempo Comum (PDF)     TEXTO

Nesta Liturgia cruzam-se as duas Alianças – as promessas celebradas por Israel  encontram o seu pleno cumprimento em Jesus Cristo que, nas palavras do velho Simeão, é “Luz para Se revelar às nações e glória de Israel vosso Povo”.

Acolher Jesus Cristo significa deixar-se transformar por Ele; por isso mesmo O aclamamos como a Luz verdadeira que ilumina os nossos olhos, que nos livra das cegueiras que teimosamente nos obstinam nos caminhos do pecado e da mentira, abre-nos para a Luz do Espírito que nos dá a sabedoria e o discernimento necessários para encontrar a alegria do Evangelho.

 

 

Festa da Apresentação do Senhor

Rui Jorge Martins

Ambroglio Lorenzetti, Apresentação do Senhor

Até 1969, a antiga festa de 2 de Fevereiro, de origem oriental, tinha no Ocidente o título de “Purificação da Bem-aventurada Virgem Maria” e encerrava o ciclo do Natal, quarenta dias após o nascimento de Jesus. No Oriente bizantino ela concentra-se no Encontro do Salvador com aqueles que veio salvar, representados pelas pessoas de Simeão e Ana: «Luz para iluminar as nações e glória do teu povo Israel».
É costume os fiéis participarem na procissão comemorativa da entrada de Jesus no templo, caracterizada pela bênção das velas, levadas acesas na procissão em honra de Cristo.

A tradição deste cortejo levou a que à Apresentação do Senhor se desse também o nome de festa de Nossa Senhora da Candelária, designação que radica na palavra “candeia”, que por sua vez tem origem no latim “candere” (arder), significando vela ou círio. Na tradição de alguns países, estas velas, depois de benzidas, são levadas para casa e acendidas nos momentos de perigo, durante os temporais e os cataclismos, em sinal da entrega de si, da família e de quanto se possui à protecção divina. Há também o costume de colocar a vela benzida nesta festa entre as mãos do cristão, no leito de morte, para que ilumine os últimos passos do seu caminho rumo à eternidade.
Os fiéis são também sensíveis ao gesto realizado pela Virgem Maria, que a par da apresentação de Jesus se submete ao rito da purificação, segundo o estipulado na Lei de Moisés.

Nalgumas Igrejas locais, a valorização de elementos inerentes ao relato evangélico desta festa, como a obediência de José e de Maria à Lei judaica – que os levou a apresentarem o Menino no templo, acompanhado da oferta de duas rolas ou pombinhas, como previa o preceito -, a pobreza dos esposos e a condição virginal de mãe de Jesus sugeriram que se fizesse do dia 2 de Fevereiro a festa daqueles que se dedicaram ao serviço de Deus e do povo nas várias formas de vida consagrada. Neste sentido, no domingo da festa da Apresentação do Senhor assinala-se em Portugal o último dia da Semana do Consagrado.

Sobre a festa da Apresentação do Senhor, escreveu o bispo S. Sofrónio (séc. VI-VII): «Todos nós que celebramos o mistério do Encontro do Senhor, corramos para Ele com todo o fervor do nosso espírito. (…) Levemos em nossas mãos o brilho das velas, para significar o esplendor divino d’Aquele que Se aproxima e ilumina todas as coisas, dissipando as trevas do mal com a sua luz eterna, e para manifestar o esplendor da alma, com o qual devemos correr ao encontro de Cristo.

Assim como a Virgem Mãe de Deus levou ao colo a luz verdadeira e a comunicou àqueles que jaziam nas trevas, assim também nós, iluminados pelo seu fulgor e trazendo na mão uma luz que brilha diante de todos, devemos acorrer pressurosos ao encontro daquele que é a verdadeira luz.
Caminhemos empunhando as lâmpadas, acorramos trazendo as luzes, não só para indicar que a luz refulge já em nós, mas também para anunciar o esplendor maior que dela nos há de vir.

Nenhum fique excluído deste esplendor, nenhum persista em continuar imerso na noite, mas avancemos todos resplandecentes; iluminados por este fulgor, vamos todos juntos ao seu encontro e com o velho Simeão recebamos a luz clara e eterna; associemo-nos à sua alegria e cantemos com ele um hino de acção de graças ao Pai da luz, que enviou a luz verdadeira e, afastando todas as trevas, nos fez participantes do seu esplendor.»

 

Docilidade e obediência

Papa Francisco, 2015

Com os olhos da mente, fixemos o ícone da Virgem Mãe, Maria, que caminha com o Menino Jesus nos braços. Introdu-Lo no templo, introdu-Lo no povo, leva-O para encontrar o seu povo.

Os braços da Mãe são como que a «escada» pela qual o Filho de Deus desce até nós, a escada da condescendência de Deus. É duplo o caminho de Jesus: desceu, fez-Se como nós, para subir ao Pai juntamente connosco, fazendo-nos como Ele.

Podemos contemplar o âmago deste movimento, imaginando a cena evangélica de Maria que entra no templo com o Menino nos braços. Nossa Senhora caminha, mas o Filho caminha antes dela. Ela leva-O, mas é Ele que a leva neste caminho de Deus que vem a nós para podermos ir até Ele.

Jesus percorreu a nossa própria estrada para nos indicar a via nova, um «caminho novo e vivo» que é Ele próprio. E, para nós consagrados, esta é a única estrada, sem alternativa, que, em concreto, devemos percorrer com alegria e perseverança.

O Evangelho alude cinco vezes à obediência de Maria e José à «Lei do Senhor». Jesus não veio para fazer a sua vontade, mas a vontade do Pai; e isso – disse Ele – era o seu «alimento». De igual modo, quem segue Jesus, abraça a via da obediência, imitando a «condescendência» do Senhor, abaixando-se e assumindo a vontade do Pai até ao aniquilamento e à humilhação de si mesmo. Para um religioso, progredir significa abaixar-se no serviço, isto é, fazer o mesmo caminho de Jesus, que «não considerou como uma usurpação ser igual a Deus».

Na narração da Apresentação de Jesus no Templo, a sabedoria é representada por dois anciãos, Simeão e Ana: pessoas dóceis ao Espírito Santo, conduzidas por Ele, animadas por Ele.
É curioso notar que neste caso, criativos, não são os jovens mas os anciãos. Os jovens, como Maria e José, seguem a lei do Senhor pela via da obediência; os anciãos, como Simeão e Ana, vêem no Menino o cumprimento da Lei e das promessas de Deus. E são capazes de fazer festa: são criativos na alegria, na sabedoria. Mas é o Senhor que transforma a obediência em sabedoria, por acção do Espírito Santo.

Através da perseverança no caminho da obediência, amadurece a sabedoria pessoal e comunitária e, assim, torna-se possível também adaptar as regras aos vários tempos: na realidade, a verdadeira «actualização» é obra da sabedoria, forjada na docilidade e na obediência.
Hoje também nós queremos, como Maria e como Simeão, tomar Jesus nos braços para que Ele Se encontre com o seu povo; mas de certeza só o conseguiremos, se nos deixarmos arrebatar pelo mistério de Cristo.

Guiamos o povo para Jesus, se, por nossa vez, nos deixarmos guiar por Ele. Isto é o que devemos ser: guias guiados.

Arquivo de Folhas Informativas anteriores a 25.11.2018