Com o reinício da celebração das Missas, chega ao fim a publicação das reflexões diárias, criadas precisamente para preencher o vazio deixado pela suspensão das celebrações comunitárias, uma iniciativa da paroquiana Margarida Oliveira.
O último texto é de Ermes Ronchi e tem por título “No fim, seremos julgados pelo amor”.
No fim, seremos julgados pelo amor
Ermes Ronchi , In Avvenire
Na margem do lago (cf. João 21,1-19), uma das perguntas mais elevadas e exigentes de toda a Bíblia: «Pedro, tu amas-me?». É comovente a humanidade do Ressuscitado: implora amor, amor humano. Pode ascender aos céus se estiver seguro de ser amado.
Não pergunta: Simão, compreendeste o meu anúncio? Está claro para ti o sentido da cruz? Diz: deixo tudo ao amor, e não a projectos de que género forem. Agora tenho de ir, e deixo-vos com uma pergunta: suscitei amor em vós? Na realidade, as perguntas de Jesus são três, diferentes de cada vez, como três etapas através das quais se aproxima passo a passo de Pedro, da sua medida, do seu frágil entusiasmo.
Primeira pergunta: «Simão, filho de João, amas-me mais do que estes?». Jesus utiliza o verbo do ágape, o verbo do amor grande, do máximo possível, do confronto vencedor sobre tudo e sobre todos.
Pedro não responde com precisão, evita quer a comparação com os outros, quer o verbo de Jesus: adopta o termo humilde da amizade, “philéo”. Não ousa afirmar que ama, muito menos mais do que os outros, um véu de sombra sobre as suas palavras: certo, Senhor, Tu sabes que te quero bem, sou teu amigo!
Segunda pergunta: «Simão, filho de João, amas-me?». Já não importam as comparações com os outros, cada um tem a sua medida. Mas há amor, amor verdadeiro por Mim? E Pedro responde entregando-se ainda ao nosso verbo sussurrado, o mais tranquilizador, mais humano, mais próximo, que conhecemos bem; agarra-se à amizade e diz: Senhor, eu sou teu amigo, Tu sabe-lo!
Terceira pergunta: Jesus volta a reduzir as suas exigências e aproxima-se do coração de Pedro. O Criador faz-se à imagem da criatura e emprega os nossos verbos: Simão, filho de João, queres-Me bem, és meu amigo?». Pelo menos o afecto, se o amor é demasiado; pelo menos a amizade, se o amor te mete medo. «Pedro, posso ter de ti um pouco de afecto?».
Jesus demonstra o seu amor baixando de cada vez as suas expectativas, esquecendo o fulgor do ágape, colocando-se ao nível da sua criatura: o verdadeiro amor põe o tu antes do eu, põe-se aos pés do amado. Pedro sente o pranto subir-lhe à garganta: vê Deus mendicante de amor. Deus das migalhas, a quem basta tão pouco, com a sinceridade do coração.
Quando interroga Pedro, Jesus interroga-me. E a questão é o amor. Não é a perfeição que Ele procura em mim, mas a autenticidade.
No anoitecer da vida, seremos julgados pelo amor (cf. João da Cruz).
E quando ele se abrir para o dia sem ocaso, o Senhor, mais uma vez, apenas me perguntará: queres-me bem?
E mesmo que mil vezes o tenha traído, ele mil vezes me perguntará: queres-me bem?
E outra coisa não tenho que responder a não ser, mil vezes: sim, quero-Te bem. E choraremos juntos de alegria.