A página da Paróquia de São Francisco Xavier vai apresentar diariamente textos para reflexão neste período conturbado da pandemia.
O texto de hoje é de Sergio Massironi.

Gestos para uma liturgia em família

Sergio Massironi

Cruz na Igreja da Sagrada Família, em Caselas

Para que Páscoa nos estamos a preparar?
A pergunta tornou-se comum, pública, sofrida.
Deveria ser a de cada ano, porque a repetição da festa nunca pode ser sinónimo de estagnação e dado adquirido.
As dramáticas circunstâncias que rapidamente envolveram larga parte da humanidade arrancam-nos, todavia, das zonas de conforto, e impõem interrogações radicais, mas talvez saudáveis.

 

O cristianismo – muitos o têm observado nos últimos dias – está diante de um desafio doméstico.
Às Igrejas perspectivam-se múltiplas possibilidades.
Imaginar uma Semana Santa em que cada um, de casa, facilmente se ligue à sua paróquia, ou ao bispo, e veja assim parcialmente reconstituir-se a unidade com os irmãos é uma boa possibilidade, impensável noutros tempos.
É o que acontecerá em muitos casos, e isto – não temos dúvidas – ajudará, consolará: será experiência real, e não virtual, dará outra amplitude ao que, de portas fechadas, acontecerá onde os pastores vão celebrar os mistérios.
Todavia, é legítimo o pressentimento que pode não bastar. Ou, pelo menos, não esgota a potencialidade do momento.

Por outro lado, não se pode esconder que as celebrações do Tríduo Pascal, coração do ano litúrgico, não são consideradas como determinantes por grande parte dos fiéis.
E se, agora, algo começasse a emergir do interior de algumas ou de muitas casas?
É uma possibilidade que deixam pelo menos entrever os elementos-chave da liturgia, que as circunstâncias actuais nos induzem a redescobrir.

Nesta Sexta-feira Santa, além da evocação da morte de Jesus, muitos são os motivos de dor a interiorizar.
Valeria a pena criar um momento de particular recolhimento, talvez na hora em que «se fez escuro em toda a Terra».
Poder-se-ia prever que ao início da tarde as persianas fossem fechadas, as luzes apagadas, e desligados todos os equipamentos tecnológicos, de maneira que durante cerca de meia hora tudo estivesse envolvido por um grande silêncio.

Às três horas inicia-se a celebração litúrgica que pode ser seguida pelos meios de comunicação, mas antes poder-se-ia fazer convergir a família para um crucifixo.
Ler-se-ia a 12.ª estação da via-sacra, ou um salmo – «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?», ou o excerto do Evangelho onde a expressão está inserida.

Poder-se-ia, depois, pedir a cada membro da família para beijar com delicadeza e intensidade o crucifixo, lendo-se, depois, a grande oração universal prevista na liturgia da paixão, ou uma adaptação, que permita sentir o mundo presente, os sofrimentos, os defuntos.