Domingo VII da Páscoa, Ascensão do Senhor (PDF)  TEXTO

Peter Reubens, Ascensão

Ajudai, ó Mãe, a nossa fé.
Abri o nosso ouvido à Palavra, para reconhecermos a voz de Deus e a sua chamada.
Despertai em nós o desejo de seguir os seus passos, saindo da nossa terra e acolhendo a sua promessa.

Ajudai-nos a deixar-nos tocar pelo seu amor, para podermos tocá-Lo com a fé.
Ajudai-nos a confiar-nos plenamente a Ele, a crer no seu amor, sobretudo nos momentos de tribulação e cruz, quando a nossa fé é chamada a amadurecer.

Semeai, na nossa fé, a alegria do Ressuscitado.
Recordai-nos que quem crê nunca está sozinho.

Ensinai-nos a ver com os olhos de Jesus, para que Ele seja luz no nosso caminho.
E que esta luz da fé cresça sempre em nós até chegar aquele dia sem ocaso que é o próprio Cristo, vosso Filho, nosso Senhor.

Papa Francisco, Oração a Maria, na conclusão da Encíclica Lumen Fidei (29 de Junho de 2013)

 

 

Ascensão: tão longe e tão perto

Ermes Ronchi

Francisco Camilo, Ascensão

O último encontro de Jesus com os seus (Mateus 28, 16-20) é sobre um monte na Galileia, a terra onde tudo tinha começado. Os montes são como dedos apontados para o infinito, a terra que se adentra no céu, banquinho para os pés de Deus, morada da revelação da luz: sobre os montes, com efeito, pousa o primeiro raio de sol e se demora o último.

Quando O viram, prostraram-se. Todavia duvidaram. Jesus deixa a Terra com um balanço deficitário: só ficaram 11 homens amedrontados e confusos e um pequeno núcleo de mulheres tenazes e corajosas. Seguiram-n’O durante três anos pelas estradas da Palestina, não compreenderam muito mas amaram-n’O muito, e foram todos ao encontro na última montanha.
E esta é a única garantia de que Jesus precisa. Agora pode voltar ao Pai, seguro de ser amado, ainda que nem de todo compreendido, e sabe que nenhum deles O esquecerá.

Jesus realiza um acto de amor, ilógica confiança em homens que continuam a duvidar, não fica a explicar e a voltar a explicar. O Evangelho e o mundo novo, que sonharam juntos, confia-os à sua fragilidade, e não à inteligência dos primeiros da aula: é a lei do grão de mostarda, da pitada de sal, dos pequenos que podem ser fermento e talvez até fogo, para contagiar de Evangelho e de nascimentos aqueles que encontrarem.

Há uma passagem surpreendente nas palavras de Jesus: a Mim foi dado todo o poder no Céu e na Terra. Ide, pois. Este “pois” é belíssimo: para Jesus é óbvio que cada coisa que é sua é também nossa. Tudo é para nós: a sua vida, a sua morte, a sua força. Ide, pois. Fazei discípulos todos os povos… Com que propósito? Alistar devotos, fazer crescer o movimento com novos adeptos? Não, mas para um contágio, uma epidemia divina a derramar sobre a Terra. Ide, perfumai de céu a vida que encontrardes, ensinai a arte de viver, assim como vistes fazer a Mim, mostrai-lhes o quanto são belos e grandes.
E depois as últimas palavras, o seu testamento: Eu estou convosco, todos os dias, até ao fim do mundo; convosco, sempre, até ao fim.

É destas palavras que compreendemos o que é a ascensão. Não foi para longe ou para o alto, para qualquer canto remoto do cosmo, mas fez-Se mais próximo do que antes. Se antes estava junto dos discípulos, agora estará dentro deles. Não foi para além das nuvens mas para além das formas. Ascendeu ao profundo das coisas, no íntimo do criado e das criaturas, e de dentro impulsiona como força ascensional para uma vida mais luminosa.
Esse Jesus que tomou para si a cruz para me oferecer em cada meu sofrer centelhas de ressurreição, para abrir brechas nos muros das minhas prisões, é Ele o meu Deus perito em evasões!

 

Topografia do Espírito

Papa Francisco, 2017

Hans von Kulmbach, Ascensão

Jesus, durante os quarenta dias da ressurreição até à Ascensão, entretinha-se com os discípulos: ensinava-lhes, acompanhava-os, preparava-os para receber o Espírito Santo… animava-os. E são precisamente as Escrituras que indicam os três lugares referenciais do nosso caminho cristão, três palavras que revelam sempre como deve ser o nosso caminho.

«Galileia», que foi dita à primeira apóstola, Madalena: «Vai e diz aos discípulos que vão à Galileia». Trata-se de uma palavra referencial, densa de significados para os discípulos. De facto, na Galileia ocorreu o primeiro encontro com Jesus, é o lugar onde Jesus os escolheu, os ensinou desde o início, os convidou a segui-l’O.

Um lugar que se reapresenta na vida de cada cristão: cada um de nós tem a própria Galileia.
É o momento no qual nos encontrámos com Jesus, em que Ele Se manifestou, em que o conhecemos, também nós sentimos esta alegria, este entusiasmo de O seguir. Encontrei o Senhor desta forma: esta família com a mãe, a avó, o catequista… E eu, ao contrário, encontrei o Senhor assim.

A Galileia, afinal de contas, indica para cada um a graça da memória porque para ser um bom cristão é necessário ter sempre a recordação do primeiro encontro com Jesus ou dos encontros sucessivos. Será ela no momento da provação a dar a certeza.

A segunda palavra que se encontra nesta ideal topografia do espírito é «Céu». Por exemplo, encontra-se no trecho em que se narra a Ascensão do Senhor: de facto, os apóstolos mantinham os olhos fixos no céu a tal ponto que alguns anjos lhes disseram: «Mas, por que estais a olhar para o céu… Ele partiu. Está lá. Voltará, mas está lá».
O Céu é onde agora está Jesus, mas não separado de nós; fisicamente sim, mas está sempre unido connosco para interceder por nós. Lá Jesus mostra ao Pai as chagas, o preço que pagou por nós, pela nossa salvação.

Assim como era necessário recordar o primeiro encontro com a graça da memória, devemos pedir a graça de contemplar o Céu, a graça da prece, a relação com Jesus na oração, neste momento nos ouve, está connosco. Como disse a Paulo, também a nós diz: «Não temas porque estou contigo». Por conseguinte, o Céu é o segundo lugar referencial da vida.

Por fim, o terceiro: «o mundo». Também no Evangelho da ascensão lê-se que Jesus diz aos discípulos: «Ide e fazei discípulos em todas as nações». Disto compreendemos que o lugar do cristão é o mundo para anunciar a Palavra de Jesus, para anunciar que fomos salvos, que Ele veio para nos dar a graça, para nos levar todos com Ele diante do Pai.

Eis então delineada a «topografia do espírito cristão». Trata-se de três lugares referenciais da nossa vida: a memória (a Galileia) a oração, a intercessão (o Céu); e a missão (ir pelo mundo).
Um cristão deve mover-se nestas três dimensões e pedir a graça da memória, dizer por exemplo: «Que não me esqueça do momento em que me elegeste, que não me esqueça do momento que nos encontrámos». Depois, é preciso orar, olhar para o céu porque Ele está lá para interceder. Por fim «ir em missão».

Ou seja, não significa «que todos devem ir ao estrangeiro; ir em missão é viver e dar testemunho do Evangelho, é anunciar às pessoas como é Jesus. Isto faz-se com o testemunho e com a Palavra, porque se eu disser como Jesus é, como é a vida cristã e viver como pagão, não funciona. A missão não é eficaz.

Resumindo: a Galileia da memória, o Céu da intercessão e da oração, a missão no mundo. Se levarmos a vida cristã desta forma, a nossa existência será boa e feliz.
Uma consequência retomada da última frase pronunciada por Jesus no Evangelho de João: «No dia em que viverdes a vida cristã assim, conhecereis tudo e ninguém poderá cancelar a vossa alegria».

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