XXX Domingo do Tempo Comum (PDF) TEXTO
A via descendente
Só depois de termos olhado atentamente nos olhos dos pobres, dos oprimidos e dos marginais, de termos prestado uma humilde atenção às suas formas de vida, de termos escutado com delicadeza as suas observações e percepções, então talvez tenhamos começado já a vislumbrar a verdade de que Jesus falava.
É um vislumbre dos «olhos curados pela graça», de que falou Tertuliano.
Algures, no fundo dos nossos corações, nós já sabemos que o êxito, a fama, a influência, o poder e o dinheiro não nos transmitem a alegria e a paz interiores por que ansiamos.
Algures podemos até sentir uma certa inveja daqueles que se despojaram de todas as falsas ambições e que encontraram uma realização mais profunda na sua relação com Deus.
Sim, algures nas profundezas de nós mesmos podemos até saborear um pouco dessa alegria misteriosa no sorriso daqueles que não têm nada a perder. Então, começamos a perceber que a via descendente não é a via que leva ao Inferno, mas a via que leva ao Céu.
Henri Nouwen, In “O esvaziamento de Cristo”
Como aproximar-se de Deus?
Papa Francisco, Março 2020
Um dos homens vai rezar para dizer que é um corajoso, como se dissesse a Deus: “Vê como sou corajoso, se precisares de alguma coisa, diz-me, que eu resolvo o teu problema”. Presunção.
A atitude do fariseu recorda o irmão mais velho da parábola do filho pródigo, que também se considerava corajoso, e que lamentava o facto de o pai nunca lhe ter oferecido uma festa, ao contrário do «desgraçado» do irmão, assim como a narrativa do rico que se banqueteava todos os dias sem se importar com a miséria de Lázaro, estendido à porta do seu palácio.
Trata-se de personagens que ostentam a segurança em si próprios, com o dinheiro, o poder, em contraposição com o publicano, que, batendo com a mão no peito, não se chega ao altar, fica à distância, comportamentos que, igualmente, lembram os do filho pródigo, ambos tendo bem presente os pecados cometidos, assim como o do mendigo Lázaro.
A parábola de hoje ensina como aproximar-se de Jesus: Com humildade, com a alma nua, sem disfarces, sem travestir-se das virtudes próprias, para quem Deus perdoa todos os pecados, mas precisa que cada pessoa lhos faça ver, com o coração nu, e não com a presunção cheia de si de quem exalta os seus méritos.
Rezar Tu e eu, cara a cara, de alma nua. É isto que o Senhor te ensina; quando nos dirigimos ao Senhor algo seguros de nós próprios, cairemos na presunção, teremos a segurança noutro lado que não Deus.
Por isso, o caminho é o abaixamento, o ser-se capaz de entender a realidade, que se sintetiza nesta certeza: «Tu és Deus, eu sou pecador; mas digo que sou pecador não da boca para fora, mas do coração».
A justificação diante de Deus é soberba, é orgulho, é exaltar-se a si próprio, é travestir-se daquilo que não se é, e por isso as misérias continuam dentro da pessoa.
Quando começamos a oração com as nossas justificações, com as nossas seguranças, não será oração, será falar com o espelho; ao contrário, quando começamos a oração com a verdadeira realidade – sou pecador, sou pecadora –, é um bom passo em frente para deixar-se olhar pelo Senhor.
Que Jesus nos ensine isto.
Se tu conhecesses o dom de Deus!
Senhor Jesus Cristo,
O Vosso olhar amoroso libertou Zaqueu e Mateus da escravidão do dinheiro; a adúltera e Madalena de colocar a felicidade apenas numa criatura; fez Pedro chorar depois da traição, e assegurou o Paraíso ao ladrão arrependido.
Fazei que cada um de nós considere como dirigida a si mesmo as palavras que dissestes à mulher samaritana: Se tu conhecesses o dom de Deus!
Vós sois o rosto visível do Pai invisível, do Deus que manifesta a sua omnipotência sobretudo com o perdão e a misericórdia: fazei que a Igreja seja no mundo o rosto visível de Vós, seu Senhor, ressuscitado e na glória.
Vós quisestes que os vossos ministros fossem também eles revestidos de fraqueza para sentirem justa compaixão por aqueles que estão na ignorância e no erro: fazei que todos os que se aproximarem de cada um deles se sintam esperados, amados e perdoados por Deus.
Papa Francisco, 2016