Domingo XXXIII do Tempo Comum (PDF)  TEXTO

O Evangelho está cheio de uma teologia simples, a teologia da semente, do fermento, dos inícios que hão-de florir. A nós toca o trabalho paciente e inteligente de quem cuida dos rebentos e dos talentos.

Deus é a Primavera do cosmo, a nós cabe a tarefa de ser o Verão fecundo dos frutos.

A pedagogia do Evangelho acompanha-nos a realizar três passos fundamentais para o crescimento humano: não ter medo, não fazer medo, libertar do medo.

Ermes Ronchi, Mosteiro de Bose, 2016

 

Qual é o património que Deus nos confia?

Papa Francisco, 2016

Qual é o património que o Senhor nos confia?
A sua Palavra, a Eucaristia, a fé no Pai celeste, o seu perdão… em resumo, tantas coisas, os seus bens mais preciosos. Não somente para ser protegido, mas para crescer!

Enquanto no uso comum o termo “talento” indica uma qualidade individual, na parábola representam os bens dos Senhor, que Ele nos confia para que os façamos dar frutos.

O buraco cavado no terreno pelo “servo mau e preguiçoso” indica o medo do risco que bloqueia a criatividade e a fecundidade do amor. Porque o medo dos riscos do amor nos bloqueia. Jesus não nos pede para conservar a sua graça num cofre! Quer que a usemos em benefício dos outros. Todos os bens que nós recebemos são para dá-los aos outros, e assim crescem.

E nós, o que fazemos? Quem ‘contagiamos’ com a nossa fé? Quantas pessoas encorajamos com a nossa esperança? Quanto amor partilhamos com o nosso próximo? São perguntas que nos farão bem. Qualquer ambiente, mesmo o mais distante e impraticável, pode-se tornar lugar onde fazer frutificar os talentos. Não há situações ou lugares incompatíveis com a presença e o testemunho cristão.

Esta parábola exorta-nos a não esconder a nossa fé e a nossa pertença a Cristo, a não enterrar a Palavra do Evangelho, mas a fazê-la circular na nossa vida, nas relações, nas situações concretas, como força que coloca em crise, que purifica, que renova.
Assim também o perdão, que o Senhor nos dá, especialmente no Sacramento da Reconciliação, não o tenhamos fechado em nós mesmos, mas deixemos que desencadeie a sua força, que faça cair muros que o nosso egoísmo levantou, que nos faça dar o primeiro passo nas relações bloqueadas, retomar o diálogo onde não há mais comunicação…

O Senhor não dá a todos as mesmas coisas e do mesmo modo: conhece cada um de nós pessoalmente e confia aquilo que é certo para cada um; mas em todos há algo de igual: a mesma, imensa confiança.

Deus confia em nós, Deus tem esperança em nós!
E isto é o mesmo para todos. Não O desiludamos! Não nos deixemos enganar pelo medo, mas vamos retribuir confiança com confiança!

A Virgem Maria encarna esta atitude no modo mais belo e mais pleno. Ela recebeu e acolheu o dom mais sublime, Jesus em pessoa, e à sua volta ofereceu-O à humanidade com coração generoso.
A ela peçamos para nos ajudar a sermos “servos bons e fiéis” para participar “da alegria do nosso Senhor”.

A barca da alegria

Cardeal José Tolentino de Mendonça

Faz-nos navegar, Senhor, na barca da alegria que largámos em algum lugar, oculta entre os ramos e a folhagem. Torna-nos disponíveis para as viagens longas, como sempre são as viagens do coração.

Que saibamos viajar pela rota das palavras reencontradas, das conversas reveladoras sem um mapa preciso, como as trajectórias dos pássaros, inesperadamente felizes. Faz com que ousemos compreender a maneira em que o Espírito ilumina o nosso presente, com os seus surpreendentes atravessamentos de portas fechadas e de incredulidades consolidadas.

Que nenhum ressentimento alente o vínculo que nos liga à memória do amor. Ajuda-nos a acolher a força trémula e fortíssima da Vida, que perdura em nós como um chamamento incessante.

Ajuda-nos a não menosprezar as nossas mãos vazias, mas a compreender que são remos para o nosso navegar entre espera e promessa. Ajuda-nos a não eliminar espiritualmente a pobreza, recordando-nos que pertencemos a uma multidão de sedentos, de impacientes, de desejadores.

Mantém-nos distantes do tempo interrompido e obscuro em que experimentamos a negação de nós mesmos e de ti. Faz com que não nos esqueçamos que o teu amor é capaz de transformar em desejo incandescente as nossas ruinas, paralisias e desistências.
E no acolhimento deste amor, faz deflagrar em nós a força geradora da Tua Presença radiosa.

 

Que tens tu que não tenhas recebido?

S. Paulino de Nola (355-431), bispo, Carta 34, 2-4

Não sejamos avaros dos nossos bens como se eles nos pertencessem…
Confiaram-nos a sua responsabilidade; temos o uso de uma riqueza comum, não a posse eterna de um bem que nos seja próprio.

Se reconheceres que esse bem só é teu cá em baixo por um tempo limitado, poderás adquirir no céu uma possessão que não terá fim.
Lembra-te daqueles servos que, no Evangelho, tinham recebido talentos do seu patrão e do que o patrão, ao regressar, entregou a cada um deles; compreenderás então que depositar o seu dinheiro no banco do Senhor para o fazer dar frutos é muito mais proveitoso do que conservá-lo com uma fidelidade estéril sem que renda nada para o credor e com grande prejuízo para o servo inútil, cujo castigo será tanto mais pesado…

Apresentemos, pois, ao Senhor os bens que d´Ele recebemos.
Com efeito, não possuímos nada que não seja um dom do Senhor e só existimos porque Ele o quer. Que poderíamos considerar como nosso, se nada nos pertence, devido a uma dívida enorme e privilegiada?
Porque Deus criou-nos, mas também nos resgatou. Rendamos-Lhe graças por isso: resgatados por grande preço, o preço do sangue do Senhor, nós não somos coisas sem valor…
Devolvamos ao Senhor o que Ele nos deu. Devolvamos Àquele que recebe na pessoa de cada pobre. Devolvamos com alegria, para receber d’Ele com júbilo, tal como nos prometeu.

 

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