Domingo II do Tempo Comum (PDF) TEXTO
Jesus voltou-Se e disse-lhes: que procurais?
As primeiras palavras são semelhantes às primeiras palavras do Ressuscitado no jardim: mulheres, quem procurais?
Duas perguntas nas quais encontramos a definição mesma do homem: um ser de procura, com uma interrogação plantada no fundo do coração.
E é através das perguntas do coração que Deus nos educa para a fé: «Encontra a chave do coração. Esta chave, verás, abre também a porta do Reino».
A primeira coisa que Jesus pede aos primeiros discípulos não é obediência ou adesão, a observância de regras ou novas fórmulas de oração. O que Ele pede é uma viagem ao coração, reentrar no centro de si mesmo, encontrar o desejo que habita a profundidade da vida: que procurais?
Ermes Ronchi, 2023
Ser discípulo de Jesus, hoje
Daniel Cadrin, 2000
Tornar-se cristão, hoje como ontem, é em primeiro lugar tornar-se discípulo de Jesus. Um discípulo caminha no seguimento de um Mestre, assume as suas opções e tenta viver, com outros, um estilo de vida inspirado nelas.
Tornar-se discípulo é uma escolha pessoal que conduz ao distanciamento da multidão. Nos nossos meios há diversas maneiras de ver Jesus.
A cultura actual, com a acção exercida pela comunicação social, acentua esta pluralidade de olhares mas sempre com a construção de consensos, de visões partilhadas e dominantes que convidam a uma conformação com essas tendências.
Ser discípulo é romper com essa resignação, não se ficar pelas ideias que circulam e ousar tomar uma posição.
O discípulo é convidado a aprofundar a identidade d’Aquele que segue. E o carácter messiânico de Jesus não se conforma com os modelos correntes. Ele é diferente e desconcertante, revelando-Se no mistério pascal, caminho de dom e de serviço, e não de poder e de glória.
Seguir este Messias implica por isso comprometer-se em formas de pensar e viver que podem estar contra a corrente da sociedade.
A preocupação com os mais pobres, o perdão, a generosidade, a recusa da força e das suas estratégias fazem parte do caminho do seguimento.
Nos preceitos que se seguem à profissão de fé de Pedro e às explicações de Jesus, são sublinhados traços particulares do discípulo que se inscrevem directamente no seguimento das escolhas e da identidade de Jesus.
Renunciar a si mesmo, tomar a sua cruz, perder a vida: estes apelos são demasiado perturbadores. Pode-se até perguntar se faz sentido viver assim. Não são eles o contrário da nossa dinâmica natural, do nosso apego a uma vida feliz?
Na linha da vida de Jesus, o primeiro desafio é o do risco e do descentramento de si.
No século I, a cruz evoca a rejeição social e o risco de morrer. Indica aos discípulos que a sua escolha pode-lhes valer perder a sua boa reputação e conduzi-los a dar a vida pelo Evangelho. O que é visível ainda hoje através de todos os mártires que se atreveram no compromisso pela paz, pela justiça, pelo amor, e que pagaram o preço dessa ousadia, como Jesus.
Este compromisso arriscado vive-se a “cada dia”, expressão que encontramos no Pai-nosso, para o pedido do pão. A renúncia de si é consequência deste risco. Na nossa cultura, onde a obsessão de si reclama muito espaço, o mesmo acontecendo com a preocupação pela segurança, este princípio surpreende, convidando a ver a existência de outra forma.
O que é que conta numa vida? Encontra-se mais alegria no dar do que no guardar-se. Uma vida centrada em si mesmo leva à perda do gosto de viver e da alegria que a acompanha. Uma abertura a alguém maior que si, um serviço atento às necessidades dos outros, com os seus imprevistos e inseguranças, estilhaçam os muros e fronteiras que nos fecham na banalidade ou na insignificância e são fontes de uma vida em abundância.
Outro traço do discípulo de Jesus é apresentado desde o início. Jesus em oração. A cada momento importante da sua vida, Jesus retira-Se para rezar, da escolha dos discípulos à agonia no jardim.
A oração pauta a vida de Jesus, Ele que no entanto é apresentado como um homem de acções e de relações, extremamente comprometido com as pessoas. É nesta oração que Jesus encontra o fôlego que mantém vivo o seu amor e o seu dom. Seria surpreendente que nós, os discípulos, agíssemos de outra forma.
Encontrei o sentido da minha vida
Papa Francisco, 2021
À pergunta «Mestre, onde moras?» Jesus não responde: “Moro em Cafarnaum ou Nazaré”, mas diz: «Vinde ver». Não um cartão de visita, mas um convite a um encontro. Os dois seguem-nO e naquela tarde permanecem com Ele. Não é difícil imaginá-los sentados a fazer-Lhe perguntas e sobretudo a ouvi-Lo, sentindo o seu coração enternecer à medida que o Mestre fala.
E de repente descobrem que, à medida que a noite cai em seu redor, neles irrompe a luz que só Deus pode dar. Uma coisa chama a atenção: um deles, sessenta anos depois, escreveu no Evangelho: «Era cerca da hora décima». Isto faz-nos pensar: cada encontro autêntico com Jesus permanece vivo na memória, nunca é esquecido. Esquecemos muitos encontros, mas o verdadeiro encontro com Jesus permanece sempre.
Depois, quando se despedem e regressam junto dos seus irmãos, esta alegria, esta luz transborda dos seus corações como um rio em cheia.
Um daqueles dois, André, diz ao seu irmão Simão «Encontrámos o Messias». Saíram certos de que Jesus era o Messias, certos.
Reflitamos por um momento sobre esta experiência de encontro com Cristo que chama para estar com Ele. Cada chamada de Deus é uma iniciativa do Seu amor. É sempre Ele que toma a iniciativa, Ele chama-nos, à vida, à fé e a um estado particular de vida: «Quero-vos aqui». A primeira chamada de Deus é para a vida, com a qual Ele nos constitui como pessoas; é uma chamada individual, porque Deus não faz as coisas em série. Depois, Deus chama à fé e a fazer parte da sua família, como filhos de Deus. Por fim, Deus chama-nos a um estado particular de vida: para nos doarmos no caminho do matrimónio, no caminho do sacerdócio ou da vida consagrada. Estas são formas diferentes de cumprir o projeto de Deus, o projeto que Deus tem para cada um de nós, que é sempre um desígnio de amor. Deus chama sempre. E a maior alegria para cada crente é responder a esta chamada, oferecer todo o seu ser ao serviço de Deus e dos seus irmãos.
Face à chamada do Senhor, que pode chegar até nós de mil maneiras, das pessoas, de acontecimentos felizes e tristes, por vezes a nossa atitude pode ser de rejeição porque nos parece estar em contraste com as nossas aspirações; e temos medo, porque a consideramos demasiado exigente e desconfortável.
Mas a chamada de Deus é amor, devemos procurar encontrar o amor que está por detrás de cada chamada, e respondemos a ela só com amor. Esta é a linguagem: a resposta a uma chamada que vem do amor é apenas amor.
E então surge espontaneamente em nós também o desejo de comunicar isto às pessoas que amamos: “Encontrei o Messias”, “Encontrei Deus”, “Encontrei Jesus”, “Encontrei o sentido da minha vida”. Numa palavra: “encontrei Deus”.