XXXIII Domingo do Tempo Comum (PDF) TEXTO

Jesus espera

Atelier de Fernando Gallego, Jesus cura o cego Bartimeu

 

O pobre Bartimeu (…) continuava ainda com mais força: Filho de David, tem piedade de mim.

O Senhor, que o ouviu desde o começo, deixou-o perseverar na sua oração.

Contigo, procede da mesma maneira.

Jesus apercebe-Se do primeiro apelo da nossa alma, mas espera. Quer que nos convençamos de que precisamos d’Ele; quer que Lhe roguemos, que sejamos teimosos, como aquele cego que estava à beira do caminho, à saída de Jericó. Imitemo-lo.

Ainda que Deus não nos conceda imediatamente o que Lhe pedimos e, apesar de muitos procurarem afastar-nos da oração, não cessemos de Lhe implorar.

Josemaria E. Balaguer, Amigos de Deus 

 

 

O Espírito continua a trabalhar como sempre

Conferência Episcopal Italiana, Mensagem para a Quaresma 2022

Massolino da Panicale, Pedro a pregar

A ancoragem à realidade histórica caracteriza a fé cristã. Não cedamos à tentação de um passado idealizado ou de uma expectativa do futuro desde a sacada da janela. Antes, é urgente a obediência ao presente, sem se deixar vencer pelo medo que paralisa, pelos lamentos ou pelas ilusões.

A atitude do cristão é a da perseverança: «Se é o que não vemos que esperamos, então é com paciência que o temos de aguardar» (Romanos 8, 25). Esta perseverança é o comportamento quotidiano do cristão que sustém o peso da história, pessoal e comunitária.

Nos primeiros meses da pandemia assistimos a um sobressalto de humanidade que favoreceu a caridade e a fraternidade. Depois, este impulso inicial foi aos poucos esmorecendo, dando lugar ao cansaço, à desconfiança, ao fatalismo, ao fechamento em si próprio, à culpabilização do outro e ao descompromisso.

Mas a fé não é uma varinha mágica. Quando as soluções para os problemas requerem percursos longos, é preciso paciência, a paciência cristã, que foge de atalhos simplistas e permite permanecer sólido no compromisso pelo bem de todos, e não para uma vantagem egoísta ou de facção.

Não terá sido, talvez, esta a firme vontade de Cristo de amar a humanidade sem Se lamentar e sem Se poupar?

Como comunidade cristã, mais do que como crentes singulares, devemos reapropriar-nos do tempo presente com paciência e permanecer na adesão à realidade. Sentimos, por isso, que é urgente a tarefa eclesial de educar para a verdade, contribuindo para colmatar a diferença entre realidade e falsa percepção da realidade. Nesta “separação” entre a realidade e a sua percepção aninha-se o gérmen da ignorância, do medo e da intolerância. Mas é esta a realidade que nos é dada e que somos chamados a amar com perseverança.

Esta segunda conversão diz então respeito ao compromisso em documentar-se com seriedade e liberdade de mente, e a suportar que há problemas que não podem ser resolvidos em breve tempo e com pouco esforço. Que pré-compreensões rígidas impedem de nos deixarmos convencer pelas novidades que provêm da realidade. De quanta paciência é capaz o coração dos crentes na construção de soluções para a vida das pessoas e da sociedade?

Permanecer fiéis à realidade do tempo presente não equivale, no entanto, a ficar pela superfície dos factos nem a legitimar cada situação em curso. Trata-se, antes, de colher «a plenitude do tempo» ou de vislumbrar a acção do Espírito, que torna cada época um «tempo oportuno».

A época em que Jesus viveu foi fundamental por via da sua presença no interior da história humana e, em particular, de quem entrava em contacto com Ele.

Os seus discípulos continuaram a viver a sua vida naquele contexto histórico, com todas as suas contradições e os seus limites: mas a sua companhia modificou o modo de estar no mundo. O Mestre de Nazaré ensinou-os a serem protagonistas daquele tempo através da fé no Pai misericordioso, a caridade para com os últimos e a esperança num renovamento interior das pessoas.

Para os discípulos, foi Jesus que deu sentido a uma época que, de outra forma, teria tido outros critérios humanos para ser julgada.

Após a sua morte, da ausência física de Jesus floresceu a vida eterna do Ressuscitado e a presença do Espírito na Igreja: «Eu apelarei ao Pai e Ele vos dará outro Paráclito para que esteja sempre convosco, o Espírito da Verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece; vós é que O conheceis, porque permanece junto de vós, e está em vós. Não vos deixarei órfãos».

O Espírito pede ao crente para considerar ainda hoje a realidade em chave pascal, como Jesus testemunhou, e não como o mundo a vê. Para o discípulo, uma derrota pode ser uma vitória, uma perda uma conquista.

O caminho sinodal está a fazer amadurecer nas Igrejas um modo novo de escutar a realidade para a julgar de modo espiritual e produzir opções mais evangélicas.

O Espírito, com efeito, não aliena da história: enquanto radica no presente, impele a mudá-lo para melhor. Para se permanecer fiel à realidade e tornar-se, ao mesmo tempo, construtor de um mundo melhor, requer-se uma interiorização profunda do estilo de Jesus, do seu olhar espiritual, da sua capacidade de ver por todo o lado ocasiões para mostrar quanto é grande o amor do Pai.

Talvez não sejamos ainda suficientemente livres de coração para reconhecer estas oportunidades de amor, porque travados pelo medo ou condicionados por expectativas irrealistas.
Enquanto o Espírito, em vez disso, continua a trabalhar como sempre.

Que acção do Espírito é possível reconhecer neste nosso tempo? Indo para além dos meros factos que acontecem no nosso presente, que leitura espiritual podemos fazer da nossa época, para progredir espiritualmente como pessoas singulares e como comunidade crente?

A Esperança ainda faz sentido?

Dehonianos, Novembro 2022

Muitas vezes temos a sensação de que o nosso mundo caminha para o abismo e que nada o pode deter.

Olhamos para o mapa dos conflitos bélicos e vemos pintados de sangue o presente e o futuro de tantos povos; olhamos para a natureza e vemo-la devorada pelos interesses das multinacionais da indústria; olhamos para as pessoas e vêmo-las fechadas no seu cantinho, desinteressadas das grandes questões (fala-se, até, de uma “geração rasca” e de “crise de valores” para descrever o quadro de desinteresse, de descomprometimento, de ausência de grandes ideais)…

A questão é: a esperança ainda faz sentido? Este mundo tem saída? Um profeta anónimo de há 2450 anos dá voz à esperança e garante-nos: Deus não nos abandonou; Ele vai intervir – Ele está sempre a intervir – no mundo…

É preciso ter consciência de que a intervenção libertadora de Deus não deve ser projectada apenas para o “último dia” do mundo…
Ela acontece a cada instante; e nós devemos estar numa espera vigilante e activa, a fim de sabermos reconhecer e acolher de braços abertos a intervenção salvadora e libertadora de Deus na nossa história e na nossa vida.

Em lugar de viverem obcecados com o fim, os cristãos devem preocupar-se em viver uma vida cristã cada vez mais comprometida com a transformação “deste” mundo.

Arquivo de Folhas Informativas anteriores a 25.11.2018