Domingo VI da Páscoa (PDF)  TEXTO

Paul Cézanne, Idosa a rezar

A oração cristã é antes de tudo escuta para chegar ao acolhimento de uma presença, a presença de Deus Pai, Filho e Espírito Santo.

A operação é simples mas não é por isso que é fácil, antes é laboriosa e requer capacidade de silêncio interior e exterior, sobriedade, luta contra os múltiplos ídolos que nos ameaçam.

Quando não está bem claro o primado da escuta de Deus, a oração tende a tornar-se uma actividade humana e é forçada a alimentar-se de actos e fórmulas.

Transforma-se numa disciplina de concentração que talvez elimine as distracções, mas não abre realmente para uma atenção orante ao Senhor que fala e que ama: que fala porque ama.

Enzo Bianchi, In Perché pregare, come pregare,

Que coisa é o amor?

Papa Francisco, 2018

Mary Cassatt, Mãe e filho

Jesus diz-nos: «Permanecei no meu amor. Não saiais do meu amor». E cada um de nós pode perguntar-se no coração: «Eu permaneço no amor do Senhor? Ou saio, procurando outras coisas, outros divertimentos, outras condutas de vida?».

«Permanecer no amor» é fazer aquilo que Jesus fez por nós. Ele deu a vida. Ele foi o nosso servo: veio para servir-nos. «Permanecer no amor» significa servir os outros, estar ao serviço dos outros.

Que coisa é o amor? Queremos pensar em que coisa é o amor? «Ah, sim, eu vi um filme sobre o amor, era belo… E aquele casal de noivos… E depois acabou mal, que pena!». Não é assim. O amor é uma outra coisa.
O amor é encarregar-se dos outros. O amor não é tocar violinos, tudo romântico… O amor é trabalho. Quantas de vós sois mães, pensai quando os vossos filhos eram pequeninos: como amastes os vossos filhos? Com o trabalho. Tomastes conta deles. Eles choravam… era preciso dar-lhes leite; mudá-los; isto, aquilo… O amor é sempre trabalho para os outros. Porque o amor faz-se ver nas obras, não nas palavras. Recordai quando se diz: «Palavras, palavras, palavras»; muitas vezes são só palavras. O amor, ao contrário, é concreto.

Cada um deve pensar: o meu amor pela minha família, no bairro, no trabalho: é serviço aos outros? Preocupo-me com os outros? (…) «Eu amo-te.» «E o que fazes por mim se me amas?» Cada um dos doentes do bairro pergunta: «O que fazes por mim?».
Na nossa família, se tu amas os teus filhos, sejam pequenos ou grandes, os pais, os idosos, que fazes por eles? Para ver como é o amor, pergunta-te sempre: que coisa faço?
«Mas padre, onde aprendemos isto?» De Jesus. E na leitura 1 João 4, 7-10 ou 1 João 4, 11-16 há uma frase que pode abrir-nos os olhos: «Nisto se manifestou o amor de Deus em nós: Deus enviou ao mundo o seu Filho». Nisto está o amor.
Não fomos nós a amar Deus; mas é Ele que nos amou primeiro. O Senhor ama sempre primeiro. Espera-nos com o amor. Também nós podemos fazer-nos a pergunta: eu espero com o amor os outros.
E depois fazer o elenco das perguntas. Por exemplo: os mexericos são amor? Aquele que diz mal dos outros… Não, não é amor. Falar mal das pessoas não é amor. «Oh… eu amo Deus. Faço cinco novenas por mês. Faço isto, aquilo…». Sim, mas… como é a tua língua? Como vai a tua língua? Esta é precisamente a pedra angular para ver o amor. Eu amo os outros? Pergunta-te: como está a minha língua? Dir-te-á se é verdadeiro amor.

Deus amou-nos primeiro. Espera-nos com o amor, sempre. Eu amo primeiro ou espero que me deem alguma coisa para amar? Como os cachorrinhos que esperam o presente, o alimento para comer e depois fazem festa ao dono. O amor é gratuito, em primeiro. Mas o termómetro para saber a temperatura do meu amor é a língua. Não vos esqueçais disto.

Quando estiverdes para fazer o exame de consciência, antes da confissão ou em casa, perguntai-vos: fiz aquilo que Jesus me disse, «permanecei no meu amor»? E como posso sabê-lo? Da maneira como a minha língua se comportou. Se falei mal dos outros, não amei.
Fazei o esforço de não falar mal dos outros. «Padre, dê-nos um remédio para não falar mal dos outros.»
É fácil. Está ao alcance de todos. Quando te vem a vontade de falar mal dos outros, morde a língua.
Ficará inchada, mas de certeza que não voltarás a falar mal.

Peçamos ao Senhor para «permanecer no amor» e compreender que o amor é serviço, é encarregar-se dos outros. E a graça de compreender que o termómetro de como está o amor é a língua.

Que coisa é o amor?

Pe. José Frazão Correia, Entre-tanto

Pelo amor e no amor aprendemos a ver mais e melhor, como quem entre-vê o sentido por entre linhas curvas; a tocar justamente cada coisa, acontecimento e pessoa, como quem é tocado por um dom surpreendente e sempre mais do que necessário; a escutar como quem pressente a promessa de cada palavra no timbre e na modulação justa dos sons que a anunciam, e, claro, em cada silêncio; a apreciar melhor e em cada parcela da realidade o gosto e o perfume da bênção que as coisas, os acontecimentos e as pessoas são.

Como a amada e o amado do Cântico dos Cânticos que reentram no Jardim do Éden, não pela nostalgia das origens perdidas, mas pela vitória do amor sobre o egoísmo, da graça sobre o pecado, da confiança sobre o medo, do desejo ordenado em Deus sobre o desejo desordenado pelo próprio amor, querer e interesse.

O amor recebido e retribuído permite reencontrar a dimensão corpórea e relacional da nossa humanidade, com os seus ritmos quotidianos e os seus lugares comuns, onde se dá, de facto, a experiência de Deus. E permite reencontrar o mundo como casa onde sentimos ser de casa e nos sentimos em casa, o espaço acolhedor e hospitaleiro, onde a posse cede, de novo, o lugar ao dom e o furto ao fruto.

Assim pode amar-se Deus em todas as coisas e amar todas as coisas em Deus.

A história pode recomeçar, agora, com coisas novas e ainda mais belas do que aquelas criadas no início.

Porque o amor é sempre novo e faz novas todas as coisas e não fica indiferente a quem dele se separa.

 

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