Domingo V do Tempo Comum (PDF) TEXTO

Bertrand Bahuet, A cura da sogra de Pedro

O episódio da cura da sogra de Pedro é descrito com simplicidade e sobriedade, sem gestos teatrais desnecessários.

Três pormenores sobressaem.

O primeiro é que Jesus “aproximou-Se” da mulher doente. Naturalmente, a iniciativa de Se aproximar de quem está prisioneiro do sofrimento, da doença, da opressão, é sempre de Jesus. Ele toma a iniciativa, pois a missão que recebeu do Pai consiste em realizar a libertação do homem de tudo aquilo que o faz sofrer e lhe rouba a vida.

O segundo é a indicação de que Jesus tomou a doente pela mão e “levantou-a”. O verbo aparece frequentemente em contextos de “ressurreição”. A mulher está prostrada pelo sofrimento que lhe limita a possibilidade de viver plenamente; mas o contacto com Jesus devolve-lhe a vida e equivale a uma ressurreição.

O terceiro é a indicação de que a mulher “começou a servi-los”. O efeito imediato do contacto com Jesus e do dinamismo de vida que d’Ele brota é a atividade que se concretiza no serviço dos irmãos.

Dehonianos

O alegre serviço de fé que se aprende na gratidão

Papa Francisco, 2022 (excertos)

Rembrandt, Jesus cura a sogra de Pedro

«A sogra de Simão estava de cama com febre», escreve Marcos. Não sabemos se se tratava de uma leve indisposição, mas na velhice até uma simples febre pode ser perigosa. Na velhice já não se controla o próprio corpo. É preciso aprender a escolher o que fazer e o que não fazer. O vigor do físico falha e abandona-nos, embora o nosso coração não deixe de desejar. Deve-se então aprender a purificar o desejo: ter paciência, escolher o que pedir ao corpo, e à vida. Quando somos velhos, não podemos fazer o mesmo que fazíamos quando éramos jovens: o corpo tem outro ritmo, e devemos ouvir o corpo e aceitar alguns limites. Todos os temos. Também eu agora tenho de caminhar com a bengala.

A doença pesa sobre o idoso de um modo diverso e novo do que quando se é jovem ou adulto. É como um golpe duro que se abate num momento já difícil. A doença do idoso parece apressar a morte e, contudo, diminuir aquele tempo de vida que já consideramos curto. Insinuam-se dúvidas de que não nos recuperaremos, que “desta vez será a última que adoeço…”, e assim por diante: estas ideias vêm-me à mente… Não se pode sonhar com uma esperança num futuro que agora parece inexistente. Um famoso escritor italiano, Italo Calvino, notava a amargura dos anciãos que sofrem a perda das coisas do passado, em vez de gozar a vinda das novas.

Mas a cena evangélica que acabamos de ouvir ajuda-nos a ter esperança e oferece-nos já um primeiro ensinamento: Jesus não visita sozinho aquela idosa doente, vai com os seus discípulos. E isto faz-nos pensar um pouco.
É precisamente a comunidade cristã que deve cuidar dos idosos: parentes e amigos, mas também a comunidade. A visita aos idosos deve ser feita por muitos, em conjunto e frequentemente.

Nunca deveríamos esquecer estas três linhas do Evangelho. Hoje, sobretudo que o número de idosos cresceu consideravelmente, inclusive em proporção aos jovens, pois estamos neste inverno demográfico, nascem menos crianças e há muitos idosos e poucos jovens. Devemos sentir a responsabilidade de visitar os idosos que muitas vezes estão sozinhos e apresentá-los ao Senhor com a nossa oração. O próprio Jesus ensinar-nos-á como os amar.

A vida é sempre preciosa. Jesus, quando vê a idosa doente, pega nela pela mão e cura-a: o mesmo gesto que faz para ressuscitar aquela jovem morta: pega na sua mão e fá-la levantar-se, cura-a pondo-a de novo de pé. Jesus, com este terno gesto de amor, dá a primeira lição aos discípulos: ou seja, a salvação anuncia-se ou, melhor, comunica-se através da atenção àquela pessoa doente; e a fé daquela mulher resplandece na gratidão pela ternura de Deus que se inclina sobre ela.

Se a primeira lição foi dada por Jesus, a segunda é-nos dada pela idosa, que “se levantou e começou a servi-los”. Com efeito, também como idosos pode-se servir a comunidade. É bom que os idosos cultivem a responsabilidade de servir, superando a tentação de ficar de lado. O Senhor não os descarta, pelo contrário, dá-lhes a força para servir. E gosto de notar que não há uma ênfase especial no relato por parte dos evangelistas: é a normalidade do seguimento.

A gratidão dos idosos pelos dons recebidos de Deus na sua vida, como nos ensina a sogra de Pedro, restitui à comunidade a alegria de viver juntos, e dá à fé dos discípulos a característica principal do seu destino.

Todos os dias há milagres, mas só vemos o extraordinário

Enzo Bianchi, 2023

Paul Bril, Jesus caminhando sobre as águas

A nossa atitude habitual e quotidiana em profundidade não espera nada, e portanto não aguarda ninguém; não consegue imaginar que do quotidiano, do outro que nos é familiar, daquele que conhecemos, possa brotar para nós uma palavra verdadeiramente de Deus. Não temos muita confiança no outro, em particular se o conhecemos de perto, mas estamos sempre prontos a acreditar no “extraordinário”, a quem quer que se imponha. Estamos de tal maneira pouco munidos de fé-confiança, que impedimos que aconteçam milagres, porque, mesmo que aconteçam, não os vemos, não os reconhecemos, e portanto permanecem como eventos insignificantes, sinais que não alcançam o seu fim.

Jesus põe-Se a curar os doentes, impõem-lhes as mãos e cura somente alguns, mas é como se não tivesse realizado prodígios, porque o milagre acontece quando a testemunha está disposta a passar da incredulidade à fé. Em Nazaré, pelo contrário, todos ficaram incrédulos, e por isso Marcos sentencia: «Não podia realizar nenhuma ação de poder». Jesus foi reduzido à impotência, não pode agir na sua força, não pode também fazer o bem, porque falta o requisito mínimo, a fé nele da parte dos presentes.

Que mal tinha Jesus? Em relação àqueles “seus”, caminhava demasiado à frente dos outros, tinha um passo demasiado veloz, via demasiado longe, tinha a parrésia, a coragem de dizer aquilo que os outros não diziam, ousava pensar aquilo que os outros não pensavam, e tudo isto permanecendo humano, humaníssimo, demasiado humano! Jesus é a sabedoria desconhecida; o profeta não acolhido precisamente por aqueles aos quais é enviado, desprezado por quantos lhe são mais próximos; o curador que não pode fazer o bem porque isso lhe é impedido pelo não acolhimento da sua ação que dá salvação.

Eis o que espera cada pessoa que tenha recebido um dom de Deus, mesmo que apenas uma migalha de profecia: torna-se insuportável, e portanto domina a convicção que é melhor não lhe dar confiança… Jesus «admira-Se com a sua falta de fé», e todavia mantém-Se firme: continua com fidelidade a sua missão em obediência àquele que o enviou, indo para outros lugares, sempre a pregar e a fazer o bem. Mas sem receber fé-confiança, Jesus não consegue nem converter nem curar, e tão-pouco fazer o bem.

Arquivo de Folhas Informativas anteriores a 25.11.2018